sábado, 11 de junho de 2011

JÁ FUI DE ESCONDER O QUE SENTIA,

"Embaixo de um guarda-chuva, numa noite fria e molhada, um homem diz para uma mulher o que ela sempre precisou ouvir. E eu pensei: como é fácil libertar uma pessoa de seus fantasmas e, libertando-a, abrir uma possibilidade de tê-la de volta, mais inteira. Falar o que se sente é considerado uma fraqueza.  Ao sermos absolutamente sinceros, a vulnerabilidade se instala.  Perde-se o mistério que nos veste tão bem, ficamos nus. E não é este tipo de nudez que nos atrai. Se a verdade pode parecer perturbadora para quem fala, é extremamente libertadora para quem ouve. É como se uma mão gigantesca varresse num segundo todas as nossas dúvidas. Finalmente se sabe. Mas sabe-se o quê? O que todos nós, no fundo,  queremos saber: Se somos amados. Tão banal, não? E no entanto esta banalidade é fomentadora das maiores carências, de traumas que nos aleija  nos paralisam e nos  afastam das pessoas que nos são mais caras. Por que a dificuldade de dizer para alguém o quanto ele é — ou foi — importante? Dizer não como recurso de sedução, mas como um ato de generosidade, dizer sem esperar nada em troca. Dizer, simplesmente. A maioria das relações — entre amantes, entre pais e filhos, e mesmo entre amigos — ampara-se em mentiras parciais e verdades pela metade. Podem-se passar anos ao lado de alguém falando coisas inteligentíssimas, citando poemas, esbanjando presença de espírito, sem alcançar a delicadeza de uma declaração genuína e libertadora: dar ao outro uma certeza e, com a certeza, a liberdade. Parece que só conseguiremos manter as pessoas ao nosso lado se elas não souberem tudo. Ou, ao menos, se não souberem o essencial. E assim, através da manipulação, a relação passa a ficar doentia, inquieta, frágil. Em vez de uma vida a dois, passa-se  a ter uma sobrevida a dois. Deixar o outro inseguro é uma maneira de prendê-lo a nós — e este “a nós” inspira um providencial duplo sentido.  Mesmo que ele tente se libertar, estará amarrado aos pontos de interrogação que colecionou. Somos sádicos e ávaros ao economizar nossos “eu te perdôo”, “eu te compreendo”, "eu te aceito como és” e o nosso mais profundo “eu te amo”— não o “eu te amo” dito às pressas no final de uma ligação telefônica, por força do hábito, e sim o “eu te amo” que significa: “seja feliz da maneira que você escolher, meu sentimento permanecerá o mesmo".

Libertar uma pessoa pode levar menos de um minuto. Oprimi-la é trabalho para uma vida. Mais que as mentiras, o silêncio é que é a verdadeira arma letal das relações humanas. 



(Martha Medeiros)

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