sábado, 30 de janeiro de 2010

É preciso ser muito grosseiro para se poder ser célebre à vontade

Às vezes, quando penso nos homens célebres, sinto por eles toda a tristeza da celebridade. A celebridade é um plebeísmo. Por isso deve ferir uma alma delicada. É um plebeísmo porque estar em evidência, ser olhado por todos inflige a uma criatura delicada uma sensação de parentesco exterior com as criaturas que armam escândalos nas ruas, que gesticulam e falam alto nas praças. O homem que se torna célebre fica sem vida íntima: tornam-se de vidro as paredes da sua vida doméstica; é sempre como se fosse excessivo o seu traje; e aquelas suas
mínimas ações - ridiculamente humanas às vezes - que ele quereria invisíveis, coa-as a lente da celebridade para especulosas pequenezes, com cuja evidência a sua alma se estraga ou se enfasta. É preciso ser muito grosseiro para se poder ser célebre à vontade.

Fernando Pessoa - Pensamentos

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